Friday, June 26, 2009

O Martírio de Galeno


Artigo do editor Carlos Marcelo, publicado no Correio Braziliense de 13.06.2009.
carlosmarcelo.df@diariosassociados.com.br

Com orgulho, o artista plástico Galeno mostra a última fase do trabalho que desenvolve, a convite do IPHAN, no interior da Igreja Nossa Senhora de Fátima. Abre um sorriso ao perceber o embevecimento dos que acompanham sua trajetória diante do resultado do maior desafio que já enfrentou: levar a sua arte às paredes da capela desenhada por Niemeyer no coração da Asa Sul.
Mas o artista baixa o olhar quando reproduz a sucessão de ironias e hostilidades que tem escutado diariamente nas últimas semanas por se recusar a seguir um modelo figurativo para a representação da aparição de Nossa Senhora às crianças portuguesas Jacinta, Lúcia e Francisco em 13 de maio de 1917.
“Tem dias que a gente perde até a vontade de trabalhar....”, disse.

Opiniões divergentes existem e sempre existiram, ainda mais quando o tema envolve religiosidade e fé. Por isso, antes de mais nada, é preciso pautar a discussão sobre os novos painéis da Igrejinha, que envolveram até o Ministério Público Federal (acionado após recebimento de abaixo-assinado com 68 nomes que não aceitam o trabalho de Galeno), pelo respeito.

Estabelecido o patamar mínimo para qualquer debate, convém tentar alcançar a dimensão do fato e não reduzi-lo a uma questão de gosto pessoal.
Pelas características únicas do projeto original, a Igrejinha é uma edificação que transcende a próprio religão: trata-se de um monumento arquitetônico e urbanístico – ali se encontram, reunidos, os gênios de Niemeyer e Athos Bulcão, em espaço de convívio idealizado por Lúcio Costa,e por isso dezenas de turistas a visitam diariamente.

“A Igrejinha não é propriedade particular dos seus fiéis freqüentadores, que lá encontram espaço para o exercício de sua fé. Ela é maior do que a população que a circunda e dele se apropria”, definiu o artista plástico Omar Franco, em comentário no blog do poeta e jornalista Luís Turiba, um dos primeiros a ampliar a discussão.
Desejar a Igrejinha ornada da mesma que outros oratórios espalhados pelo Brasil é, em última instância, recusar Brasília. Significa a rejeição ao projeto original da cidade em prol da reprodução de moldes seculares – um dos freqüentadores chegou a sugerir que Galeno projetasse uma imagem sacra na parede e se limitasse a copiá-la. Mais preocupante do que esta visão reducionista da capital e do processo criativo do artista, porém, é tomar conhecimento dos episódios de desrespeito à arte de um brasileiro nascido em 13 de maior e que, por isso, carrega Nossa Senhora não apenas na inspiração. Porque o nome completo do artista que tem sido hostilizado por alguns fiéis é Franscisco de Fátima Galeno. Um piauiense radicado no Planalto Central desde 1959; um brasiliense como todos nós.

Leia mais: http://blogdoturiba.blogspot.com/

No comments: